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Uma das marcas da gestão da gestão de Jair Bolsonaro foram os ataques seus e de seus seguidores aos veículos de comunicação nacionais e internacionais, há vários registros do ex-presidente agredindo jornalistas, principalmente mulheres. A excessiva circulação de fake news e a necessidade de combater a desinformação também passaram a fazer parte da rotina dos brasileiros com Bolsonaro. Helena Martins, professora da Universidade Federal do Ceará, coordenadora do Telas – de pesquisas em Economia, Tecnologia e Políticas de Comunicação da UFC e integrante do DiraCom – Direito à Comunicação e Democracia conversou com o Brasil de Fato sobre o papel e a importância da comunicação e do jornalismo para a existência do Estado Democrático de Direito, sobre o combate a produção e divulgação de Fake News e muito mais. Confira.
Qual é o papel da comunicação dentro de um Estado Democrático de Direito?
Em primeiro lugar é importante ter em vista que não é possível falar em democracia sem a possibilidade da sociedade, de cada cidadão estar informado e ter condições de participar do debate público, das deliberações e, até mesmo, fazer as suas escolhas nas eleições e no cotidiano. Então, para o Estado Democrático de Direito é fundamental que a gente tenha também jornalismo, no sentido de apresentar essas informações de uma forma organizada para a população, comunicação, inclusive, do próprio Estado de modo que possa também fornecer informações do que desenvolve, dar transparência às suas ações. A transparência, inclusive, é um dos princípios da administração pública, de acordo com a Constituição Brasileira. Então tudo isso fala da possibilidade de participação na esfera pública por parte da população em geral.
O que é a liberdade de imprensa e qual a diferença entre liberdade de imprensa e liberdade de expressão?
A liberdade de imprensa é uma ideia que surge, de fato, com a configuração de veículos de comunicação da própria imprensa. Então os registros mais antigos, segundo Venício Lima, professor que se dedica a esse tema, datam aí do fim do século XV, mas, sobretudo, a partir da configuração da burguesia, da organização de imprensa é que a gente tem aí um crescimento dessa atividade e uma reivindicação da possibilidade de imprimir livremente.
Acho que o centro da ideia da liberdade de imprensa é a possibilidade de imprimir, de fazer circular informações e opiniões sem a intervenção do Estado. A própria defesa dessa liberdade de imprimir tomou um lugar muito forte em relação aos Estados, até então autoritários, no sentido de permitir a circulação das informações produzidas por vários personagens, inclusive, burgueses. Já a liberdade de expressão é uma ideia muito mais antiga, uma compreensão que está associada à capacidade de autogoverno. Se aproxima hoje, portanto, de uma ideia da cidadania.
Essa perspectiva da liberdade de expressão, segundo Venício Lima é bastante antiga, ela aparece seis séculos antes de Cristo, para a gente ter uma ideia de como essa necessidade de participação informada na esfera pública é muito antiga, e dá também o tom de como ela é essencial para que a gente possa ter, de fato, uma participação informada, ter o que hoje nós chamamos de cidadania.
A diferença é que a liberdade de expressão é uma liberdade muito mais ampla, significa que todas as pessoas devem poder expressar suas opiniões livremente, poder circular, ter o direito de fala. A liberdade de imprensa ela já está muito mais associada, de fato, a atividade de imprimir, uma atividade que foi com o passar do tempo se tornando cada vez mais restrita a algumas empresas, ou mesmo a conglomerado midiático como a gente viu a partir do século XX. Então, a liberdade de expressão é mais ampla, e não à toa, por isso ela é considerada também um direito humano fundamental.
A comunicação e o jornalismo têm um papel importante de divulgar a verdade, mas dá para perceber um crescimento na divulgação de fake news. Na sua opinião por que cresceu tanto?
É importante perceber que com o crescimento do que antes eram impressores, editores individuais naquilo que foi sendo transformado em grandes conglomerados midiáticos, empresas que têm seus objetivos econômicos, políticos e ideológicos, o trato da informação passou a assumir vieses, inclusive, viés de classe. Então, desde a configuração dos grandes meios de comunicação nós temos a produção de uma informação muito deturpada, porque são pautadas por esses interesses dos donos desses meios. A partir da perspectiva da economia política da comunicação, a gente percebe que a disputa em torno da informação é uma disputa histórica e não à toa nós convivemos historicamente com manipulação da informação, com a criação de estereótipos, com o silenciamento.
Nós já temos uma produção de desinformação historicamente, mas em determinados momentos históricos, onde a gente tem uma disputa muito forte, em vez de você ter esse trabalho cotidiano, de criação, de uma informação inclinada, enviesada, você tem também a estratégia de lançar mão diretamente de fake news, de desinformação, de mentiras, isso pode ser associado aos grandes veículos de comunicação e também, cada vez mais, devido aí às transformações tecnológicas, a configuração atual da internet e a utilização desse meio de comunicação por determinados grupos políticos.
O que eu quero dizer com isso é que, para mim, o aumento da desinformação em determinados momentos está muito relacionado a uma intensificação da disputa da informação e uma intensificação que está, por sua vez, associada aí às próprias disputas de rumos da sociedade. Nós vivemos uma crise, uma crise do sistema capitalista muito profunda e para essa crise são apresentadas as mais diversas respostas à esquerda e à direita. A direita utiliza a estratégia de desinformação para incidir nessa crise. Não à toa muitas das desinformações, que esse campo político circula, vão de encontro às instituições, trabalha em uma lógica de romper as mediações constituídas pelo próprio Estado Democrático de Direito, vão minando aí outros agentes políticos como, no caso do Brasil, o STF, por exemplo, para se legitimar e para fazer com que a sua visão de mundo, seja a visão de um mundo abraçada pelos receptores dessa desinformação.
E aí a gente entra em uma certa contradição, porque de fato, por mais que os meios de comunicação tradicionais, o que às vezes é chamado de jornalismo profissional, se baseiem nos interesses também dos seus donos, eles também foram constituídos historicamente por sujeitos, regras, pressões sociais e regulações que acabaram também criando toda uma forma de ser desse jornalismo, que faz com que ele não seja declaradamente, ou abertamente mentiroso. Você tem ali a ideia de dois lados, por mais que sejam ideias muito frágeis, a própria ideia de imparcialidade, são ideias que de alguma forma orientam a própria produção informativa e que constróem caminhos de pressão social para que essa informação, construída pelos meios tradicionais, sejam informações minimamente vinculadas com a realidade.
Tem também a questão dos profissionais, a atuação deles, as brechas que eles cavam nessa imprensa. Esses veículos de comunicação tradicionais são guiados por valores, por compromissos profissionais que não aparecem, de forma alguma, no que a gente tem visto na internet a partir, especialmente, de alguns veículos que operam na internet, que são veículos desinformativos. Claro que há outros veículos populares alternativos muito interessantes e fundamentais, eu diria, para a liberdade de expressão, para o direito à comunicação no âmbito da rede, mas o que a gente tem visto aí no caso da extrema-direita é a produção de informação completamente dissociada de qualquer compromisso ético, político e profissional.
Por várias vezes vimos a imprensa sendo atacada por bolsonaristas. Por que há tanta rejeição aos meios de comunicação?
Como a gente tem uma imprensa tradicional aqui no Brasil, especialmente, muito desvinculada da sociedade, muito distante, muito fechada aos anseios, aos clamores sociais e muito criticada por toda essa sua postura, inclusive postura política, seja durante a ditadura militar, ou mais recentemente durante o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, você tem uma imprensa que é difícil de ter a sua legitimidade ressaltada pela população de uma forma geral. É uma imprensa com muitas falhas e que acabou também abrindo muitas margens para que essa extrema-direita atue contra essa instituição, que é uma instituição importante para a democracia, que é a instituição midiática.
Então você tem esse cenário muito difícil para a imprensa que precisa por um lado se legitimar socialmente, que tem sido atacada e que também, por outro lado, tem outro desafio que é um desafio econômico, inclusive. O crescimento do número de veículos de comunicação tem levado a uma dispersão da audiência, então muitos veículos, jornais, por exemplo, Jornal O Globo tem hoje uma audiência muito menor do que tinha há alguns anos. Não à toa eles se aproveitam também desse momento de muita crítica a desinformação para se arvorar como donos da verdade, como os jornalistas e os jornais que têm credibilidade. Tem toda uma disputa também de audiência, de economia, portanto, de poder que passa em meio a essa disputa mais ampla sobre a informação de qualidade que deve circular no Brasil.
Qual a importância da comunicação para esses próximos anos onde teremos novos governos?
Nós temos para os próximos anos disputas muito importantes no campo da comunicação. Todo o estado de coisas que nós temos visto está diretamente relacionado a comunicação. Eu falo aqui do ataque à democracia e da projeção de valores conservadores na sociedade. Isso não pode ser lido sem que sejam considerados também fatos como a ampla concentração midiática no Brasil, a ausência de pluralidades, de diversidade, a ocupação da TV aberta, do rádio, por fundamentalistas, por programas policialescos que atentam e promovem leituras contra os direitos humanos, contra a esquerda e o campo progressista de uma forma geral. Nós chegamos até aqui muito por conta também do cenário de comunicação que se constituiu no Brasil e é importante enfrentar esses antigos desafios.
Agora nós também temos novos desafios: a desinformação que acontece na internet está extremamente associada a própria configuração que a internet tem hoje, pautada por interesses capitalistas das plataformas digitais e por um modelo de negócios que é baseado em uso de dados, em projeção de conteúdos, quaisquer conteúdos, sem que haja nenhum compromisso ético e político por conta de ampliação de visibilidade a partir do pagamento, por um certo interesse em manter as pessoas vinculadas diretamente àquele conteúdo numa lógica de disputa da atenção da população. Nessa disputa tem lugar aí os conteúdos mais extremados que acabam também gerando muita atenção, gerando muitos comentários, muitos compartilhamentos. Enfim, há todo um modelo de negócios que fala de uma economia política das plataformas digitais que é muito problemática para a sociedade como um todo e esse é um novo desafio que deve ser encarado pelos próximos governos.
Isso já tem acontecido em alguns lugares do mundo, a União Europeia aprovou duas leis recentemente que tratam do tema da organização dos mercados e dos serviços digitais, vários países dos BRICS também têm tido debates sobre essa questão. Então acho que é um outro campo também de desafio que tem que ser encarado pela sociedade brasileira e, particularmente, pelos governos que devem desenvolver não só mecanismos atualizados de diálogo com a sociedade para conferir transparência às suas ações, para pôr em debate público as suas medidas, mas também que devem atuar no sentido de organizar esse ambiente tão fundamental para a democracia por meio dos mecanismos de regulação, de políticas públicas. Isso é muito importante que seja de fato desenvolvido no Brasil.
Entrevista dada ao jornalista Francisco Barbosa por Helena Martins. Brasil de Fato. Ceará, 26 de Janeiro de 2023
Se alguma dúvida restasse para mostrar que está em curso um plano sinistro de quebra da democracia no Brasil, o domingo chegou com todas as evidências. Realmente estamos a caminho da desordem inspirada num bolsonarismo revanchista, que aposta no caos, sob a égide da intranquilidade e da desarmonia da sociedade. Outra coisa não se constatou naquelas cenas selvagens de depredação das dependências do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal, com agravante – seriíssima – de serem agredidas, a um só tempo, quase orquestradamente, as sedes dos três poderes constituídos. Nada mais ostensivo para denunciar o propósito do modelo de ditadura direitista, sonho alimentado por um ex-presidente que, confortavelmente distante do cenário da violência colocada a serviço de seus propósitos, insiste em desconsiderar a manifestação das urnas, que lhe foi hostil.
Fracassado na tentativa de tornar suas reféns as Forças Armadas, partindo para segmentos da população civil, a fim de torná-los instrumento do crime que arquiteta, Bolsonaro continua tramando contra a democracia no Brasil. Insiste em alimentar tensões e, na sordidez desse plano, joga com a mobilização de correligionários arregimentados em vários estados para concentrá-los em Brasília. Gente falsamente rotulada como manifestantes descontentes com os rumos do novo governo e do processo eleitoral que o legitimou.
Espanta que os preparativos para essa mobilização, tão clara nas intenções, não tenha servido de prévia advertência aos setores de segurança, lerdos no cumprimento de seus deveres naquele momento. Este é um detalhe que convém apurar, sob a suspeita de que a tolerância pode estar conivente com a campanha de quebra da normalidade. É tudo de indesejável, no momento naturalmente delicado em que se instala o novo governo. Apurar e denunciar responsabilidades, diretas ou coadjuvantes, é tão necessário como adotar medidas severas para que não se repitam atos da insolência bolsonarista, como a que fomos obrigados a assistir neste domingo, que teve tudo para lastrear preocupações.
Claríssimo, então, que se tenta submeter o Brasil ao desassossego geral, é preciso que a nação se ponha de pé, redobre a vigilância e condene, com patriótica veemência, o esquema que o ex-presidente montou, delirando com a retomada de poderes que a expressão democrática do povo lhe negou.
Desordem, Jornal do Brasil, 9 de Janeiro de 2023
O ano que se vai, levando Jair Messias Bolsonaro para o ostracismo, dá lugar a 2023, que nos traz a esperança de que a vitória da opção pela democracia restabeleça a concórdia entre os brasileiros no 3º governo Lula. Luís Inácio Lula da Silva já demonstrou as vantagens da boa negociação política, com a formação de um eclético ministério com 37 comandantes, dos quais 11 são mulheres. A última indicada, para o Ministério do Turismo, foi a deputada federal Daniela de Souza Carneiro, reeleita em 2022
como a mais votada do Rio de Janeiro, com 213 mil votos, pelo União Brasil. Superou o candidato de Bolsonaro, o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, que teve inacreditáveis 205 mil votos negacionistas (e o dobro de mortes na Covid).
Mais conhecida como a Daniela do Waguinho, o prefeito de Belford Roxo, Wagner dos Santos Carneiro, a deputada Daniela, nascida na pequena Italva, no norte do Estado do Rio, que tem 15 mil habitantes, 500 mil a menos que o município da Baixada Fluminense, o 6º maior do estado, logo abaixo de Niterói, é pedagoga e pode não entender muito de turismo, mas preencheu três critérios importantes buscados por Lula para ampliar a base de apoio do novo governo: é mulher; era vice-líder de um dos partidos com bom cacife no Congresso (o União Brasil, que elegeu 59 deputados federais e 10 senadores); e, por último, mas não menos importante, trata-se de uma líder evangélica (hoje, 30% do eleitorado), que chegou a ter agendas comuns com a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro e o presidente que deixou o país pela porta lateral do Palácio da Alvorada e foi se refugiar na Flórida (Orlando ou Miami, não se sabe ao certo ainda).
Sempre me chamaram atenção, nos filmes americanos, os aeroportos como locais de despedidas, em Hollywood, e as plataformas dos trens, como local de encontros e despedidas, na filmografia europeia. Com o tempo, aprendi que havia muito “merchandising” nos “frames” de logos das companhias de aviação. Quantos filmes com Los Angeles ou San Francisco, na costa Oeste, como ponto de partida rumo a Nova Iorque, Washington ou Chicago, não exibiam o logo da TWA, do excêntrico bilionário Howard Hughes, dono de estúdios e da Hughes Aircraft (vendida em 1997)? Já a filmografia do francês Claude Lelouch é plena de referências ferroviárias. Quem não lembra de “Um Homem e uma mulher”, de “Un jour, um train”, ou ainda do magnífico “Les uns, les autres”, um épico de 1981 que trata da reconciliação de várias famílias vítimas das brutalidades da Segunda Guerra Mundial. Para quem não está ligando o nome ao enredo, lembro que aqui ganhou o título de “Retratos da Vida”. Até hoje me emociono com a cena do balé “Bolero” de Ravel, com Jorge Dom, ao pé da Torre Eiffel. Recomendo.
No Brasil, encontros e despedidas dos brasileiros se dão nas rodoviárias (só neste século os aeroportos começaram a ser frequentados pela classe média baixa). Pois coube ao mineiro Milton Nascimento, que abandonou o canto este ano com o megashow no Mineirão “A Última Sessão de Música”, fazer, em parceria com o saudoso Fernando Brant, a inesquecível “Encontros e Despedidas”, que lançou Maria Rita, filha de Elis, em 2004. Em Minas, o trem marcava o destino das pessoas. Essa letra de Brant, musicada por Bituca, em 1985 – a dupla fez ainda “Travessia”, “Beco do Mota”, “Canção da América”, “Maria, Maria” (o maior espetáculo que vi na vida, em 1976, no Teatro do Hotel Nacional, em São Conrado, com Milton Nascimento, o balé “O Corpo” e a entrada triunfal de Clementina de Jesus”; ao recordar a cena, fico arrepiado), e ainda “Nos Bailes da Vida” e tantas outras – me inspirou a escrever a coluna para nos despedir de 2022 e saudar 2023.
Diz a letra em seu final: “(…) “São só dois lados/ Da mesma viagem/ O trem que chega/ É o mesmo trem da partida/ A hora do encontro/ É também despedida/ A plataforma dessa estação/ É a vida desse meu lugar/ É a vida desse meu lugar/ É a vida”.
Espero que a plataforma que nos separou em 2022 de 2023 traga “gente que chega pra ficar” (…) e leve “gente que vai pra nunca mais”: Jair Bolsonaro, que não vai à estação passar a faixa presidencial.
Eles se merecem
O genial escritor e cronista José Eduardo Agualusa, o angolano que se radica ora em Lisboa ou no Brasil, quando não está em Luanda ou Moçambique, com o colega Mia Couto, sendo a verdadeira tradução da “Comunidade dos Países de Língua Portuguesa” [criada em 1996, no governo de Fernando Henrique Cardoso, em genial sacada do embaixador José Aparecido de Oliveira, reúne um grupo nove países “lusófanos”, entre os quais se destaca o Brasil, com 215,5 milhões de habitantes, secundado por Angola, com 32 milhões e Moçambique, com 29 milhões, os países que sofreram influência da colonização de Portugal (12 milhões de habitantes), cujos domínios chegaram à Índia (Goa), China (Macau) e Japão e se restringiu à independente de Timor-Leste, uma das 17 mil ilhas que se libertou da Indonésia]. Pois Agualusa escreveu ontem, em sua coluna em “O Globo”, ao comentar a partida de Bolsonaro para a Flórida, (onde disse que ficaria um tempo em Mar-a-Lago, empreendimento que o ex-presidente Donald Trump construiu em Palm Bech, principal balneário da Flórida, e se refugiou quando deixou o poder, em 20 de janeiro de 2021, depois de incitar a infame invasão do Capitólio, em 6 de janeiro, para impedir a diplomação de Joe Biden e Kamala Harris), que “os dois se merecem”: Trump teria que aturar Jair Bolsonaro e o ex-presidente teria que aturar Donald Trump.
Só que o avião da Presidência da República Federativa do Brasil levou na 6ª feira, 19 de dezembro, o então presidente (hoje já ex-presidente) a Orlando, sede da Disney, com a mulher, Michelle, assessores especialmente designados para acompanhar o ex-presidente e familiares, tudo pago com o (seu, meu, nosso) dinheiro público. Não há certeza da estadia em Mar-a-Lago. Antes pode haver encontro de patetas na Disneyworld.
Mas entre os derradeiros atos antes da fuga do Brasil, Bolsonaro fez uma extensa “live” no dia 29 de dezembro, justificando os dois meses de mutismo quase total, para decepção de seus fanáticos seguidores que ainda clamavam, diante de quartéis do Exército, por uma “intervenção federal” liderada pelo presidente derrotado, com apoio das Forças Armadas. Preocupado com a comunicação, meio “tati-bi-tate”, com os apoiadores, Bolsonaro perdeu a primazia para Luís Inácio Lula na Silva nas manifestações de pesar pelo falecimento do grande cidadão brasileiro Edson Arantes do Nascimento, o imortal Pelé. Só uma hora depois de Lula, a Secretaria-Geral da Presidência da República, que era comandada pelo general Luiz Eduardo Ramos, soltou uma nota lamentando a perda, e terminando com um parágrafo de condolências do presidente Jair Bolsonaro.
A comparação com a tíbia mensagem da “live”, cuja íntegra de um trecho importante está a seguir, deixa claro que não pode ter sido ele o autor nem o mentor da nota sobre Pelé: “Tem gente chateada, que [eu] deveria ter feito alguma coisa, qualquer coisa. Eu não poderia fazer o que o outro lado fez, e digo: para conseguir certas coisas, mesmo dentro das quatro linhas, você tem que ter apoio”. Entendeu, caro leitor? Creio que está confessando que não teve competência e apoio para dar um golpe (como Jânio na renúncia, em agosto de 1961). Como não teve competência para gerir os destinos do Brasil durante quatro anos de destruição do país, revelada no diagnóstico da Equipe de Transição, e cuja repercussão passou a 2º plano, depois da perda de Pelé.
Menos crível é ter sido de sua autoria a mensagem de sábado, 31 de dezembro, quando já estava em Orlando (EUA), sobre a morte do Papa Emérito Bento XVI: “Recebi, com grande pesar, a notícia do falecimento do Papa (emérito) Bento XVI. Embora seu pontificado tenha sido curto, deixa um legado imenso para a Igreja católica, para todos os cristãos e para a humanidade. Orientou sua missão pelo lema: “Cooperadores da Verdade”. Foi um servidor dedicado da Verdade e da boa doutrina. Em defesa da verdade do Evangelho, criticou sem medo os erros da chamada “teologia da libertação”, que pretende confundir o Cristianismo com conceitos equivocados do marxismo. O Papa Bento, ao contrário, fundamentou todos os seus escritos e ensinamentos na Verdade que liberta (João, 8,32). Que seu exemplo e sua obra magistral de grande teólogo e Pastor possam educar e iluminar a todos nós”, conclui a nota voltada ao eleitorado conservador. [E Lula também se manifestou antes sobre Bento XVI, com quem esteve no Vaticano, com a esposa Marisa Letícia, e a quem recebeu na visita ao Brasil, em 2007].
A menos que Bolsonaro tenha tido surto de inteligência e clarividência ao pousar nas terras de Tio Sam, esse ato final deixa parecer óbvio que boa parte das mensagens despejadas em seu Twitter ou na sua conta no Instagram jamais foram de sua autoria. O acesso do filho 02, o vereador Carlos Bolsonaro, à conta do Presidente da República, merece uma investigação rigorosa da administração de Luís Inácio Lula da Silva, bem como as centenas e milhares de atos secretos ou que guardaram sigilo de 100 anos.
Feliz 2023, com democracia e diálogo
Dito isto, só resta desejar a todos que o Brasil tenha um ambiente mais leve, de concórdia e reconciliação. Espero que o processo já tenha começado na noite de “réveillon”, na reunião de familiares e amigos para a celebração do Ano Novo. Acredito que muita gente vibrou com a queima dos fogos por ter o Brasil se afastado da marcha para o autoritarismo e retornado ao leito democrático.
GILBERTO MENEZES CÔRTES, Jornal do Brasil, 1 de Janeiro de 2023
Liberdade e Pensamento Crítico deseja a todos Boas Festas e um Ano Novo pleno de justiça social, paz e democracia
MOSTRA | 12 dez. ’22 – 17 fev. ’23 | Inauguração: 17h00 | Sala de Referência | Entrada livre
Vítor Ramos: uma trajetória no exílio
MOSTRA | 12 dez. ’22 – 17 fev. ’23 | Inauguração: 17h00 | Sala de Referência | Entrada livre
Curadoria: Guiomar Ramos
Mesa Redonda
12 dez. ’22 | 18h00 | Auditório | Entrada livre
Com a participação de Luiz Bigotte Chorão, Heloisa Paulo, Sérgio Campos Mattos, Júlia Coutinho, Guiomar Ramos, Fernão Ramos e Fábio Ruela (on line) Jaelson e Joaquim de Carvalho, ainda a confirmar (on line).
Documentário Por Parte de Pai
Todas as terças-feiras, 13 dez. ’22 – 14 fev. ’23 | às 11h00 e às 15h00 | Sala Multimédia | Entrada livre
O documentário conta-nos a trajetória do professor e militante português Vítor Ramos, revisitada pelo olhar de sua filha Guiomar Ramos. Através de cartas e fotografias, além de uma viagem aos países onde o seu pai viveu, Guiomar Ramos procura compreender as circunstâncias da sua morte, poucos dias após o 25 de abril de 1974, sem que conseguisse regressar ao seu país natal, depois de vinte anos longe de sua terra.
Para assistir online clique e siga para a página: https://videoconf-colibri.zoom.us/j/91301897983#success
A leitura encenada de cartas e aerogramas enviados pelos soldados dos três cenários da Guerra Colonial – Angola, Guiné e Moçambique, durante os 13 anos de guerra.
Realizado no âmbito do projecto “Abril é Agora” no CAL (Centro de Artes de Lisboa), na Rua de Santa Engrácia, no Vale de Santo António (Graça). Um trabalho de um coletivo liderado por Leonor Buescu, a partir de material disponível na Liga dos Amigos do Museu Histórico Militar.